segunda-feira, 11 de março de 2013

O "Amor Natural": sexualidade à flor da pele na poesia de Drummond




Se preferir ouvir este aúdiopost em vez de ler CLIQUE NO VIDEO ABAIXO:



Depois de ler esse livro, O Amor Natural, lançando em 1992, Drummond, que já me encantava, com seus poemas, mostrou-me que a natureza humana tem um quê de eros e psiquê desinibidos, ele revela os sentidos, desnudando e traduzindo o lado bom da libido. Drummond escreve lindamente os prazeres do corpo, a sensualidade da natureza humana, o alcance da psique, do prazer lídimo, legítimo, do amor natural. Drummond transita entre o erótico e o pornográfico com uma leveza tamanha, que nos deixa extasiados. Revela-se entre o lado sexual instintivo e humanizado, a dialética perfeita, exultando  a condição ínfima  do ser humano, despido de qualquer pudor ou moralidade.  Mostrando o sexo no lado primitivo e animal:  ato, suor,  sêmen, gemido, desejo, gozo, corpo.  Socializo com vocês alguns poemas  retirados  de O Amor Natural, de Carlos Drummond de Andrade.


AMOR — POIS QUE ÉPALAVRA ESSENCIAL
Amor — pois que é palavra essencialcomece esta canção e toda a envolva.Amor guie o meu verso, e enquanto o guia,reúna alma e desejo, membro e vulva.
Quem ousará dizer que ele é só alma?Quem não sente no corpo a alma expandir-seaté desabrochar em puro gritode orgasmo, num instante de infinito?
O corpo noutro corpo entrelaçado,fundido, dissolvido, volta à origemdos seres, que Platão viu contemplados:é um, perfeito em dois; são dois em um.
Integração na cama ou já no cosmo?Onde termina o quarto e chega aos astros?Que força em nossos flancos nos transportaa essa extrema região, etérea, eterna?
Ao delicioso toque do clitóris,já tudo se transforma, num relâmpago.Em pequenino ponto desse corpo,a fonte, o fogo, o mel se concentraram.
Vai a penetração rompendo nuvense devassando sóis tão fulgurantesque nunca a vista humana os suportara,mas, varado de luz, o coito segue.
E prossegue e se espraia de tal sorteque, além de nós, além da própria vida,como ativa abstração que se faz carne,a idéia de gozar está gozando.
E num sofrer de gozo entre palavras,menos que isto, sons, arquejos, ais,um só espasmo em nós atinge o clímax:é quando o amor morre de amor, divino.
Quantas vezes morremos um no outro,no úmido subterrâneo da vagina,nessa morte mais suave do que o sono:a pausa dos sentidos, satisfeita.
Então a paz se instaura. A paz dos deuses,estendidos na cama, qual estátuasvestidas de suor, agradecendoo que a um deus acrescenta o amor terrestre.

Sugar e ser sugado pelo amor
no mesmo instante boca milvalente
o corpo dois em um o gozo pleno
Que não pertence a mim nem te pertence
um gozo de fusão difusa transfusão
o lamber o chupar o ser chupado
no mesmo espasmo
é tudo boca boca boca boca
sessenta e nove vezes boquilíngua.
A língua lambe
da rosa pluriaberta; a língua lavra
certo oculto botão, e vai tecendo
lépidas variações de leves ritmos.
a licorina gruta cabeluda,
e, quanto mais lambente, mais ativa,
atinge o céu do céu, entre gemidos,
entre gritos, balidos e rugidos
de leões na floresta, enfurecidos.
A castidade com que abria as coxas
e reluzia a sua flora brava.
Na mansuetude das ovelhas mochas,
e tão estreita, como se alargava.
sepultura na grama, sem dizeres.
Em minha ardente substância esvaída,
eu não era ninguém e era mil seres
primeiro gesto nu ante a primeira
negritude de corpo feminino.
E nem restava mais o mundo, à beira
dessa moita orvalhada, nem destino.
Mimosa boca errante
à superfície até achar o ponto
em que te apraz colher o fruto em fogo
que não será comido mas fruído
até se lhe esgotar o sumo cálido
e ele deixar-te, ou o deixares, flácido,
mas rorejando a baba de delícias
que fruto e boca se permitem, dádiva.
impaciente de sugar e clausurar
inteiro, em ti, o talo rígido
mas varado de gozo ao confinar-se
no limitado espaço que ofereces
a seu volume e jato apaixonados
como podes tornar-te, assim aberta,
recurvo céu infindo e sepultura?
que devagar vais desfolhando a líquida
espuma do prazer em rito mudo,
lenta-lambente-lambilusamente
ligada à forma ereta qual se fossem
a boca o próprio fruto, e o fruto a boca,
oh chega, chega, chega de beber-me,
de matar-me, e, na morte, de viver-me.
Sem que eu pedisse, fizeste-me a graça
de magnificar meu membro.
Sem que eu esperasse, ficaste de joelhos
em posição devota.
O que passou não é passado morto.
Para sempre e um dia
o pênis recolhe a piedade osculante de tua boca.
na total impossibilidade de gesto ou comunicação.
Não te vejo não te escuto não te aperto
mas tua boca está presente, adorando.




Sugar e ser sugado pelo amor

A língua lambe as pétalas vermelhas
E lambe, lambilonga, lambilenta,

A castidade com que abria as coxas
Ah, coito, coito, morte de tão vida,
em mim ressuscitados. Era Adão,
Roupa e tempo jaziam pelo chão.

Mimosa boca errante
Boca mimosa e sábia,
Mimosa boca e santa,
Já sei a eternidade: é puro orgasmo.

Sem que eu pedisse, fizeste-me a graça
Hoje não estás nem sei onde estarás,
Adorando.
Nunca pensei ter entre as coxas um deus.

2 comentários:

  1. Vou começar acompanhar seus post's. Pelos que já assisti, via YouTube, gosto do seu trabalho e agradeço-te por compartilhar todo esse conhecimento de uma forma tão sensível e compreensível. Beijos

    ResponderExcluir
  2. Olá. Estive visitando o seu blog, gostei muito e me tornei seguidora.
    Eu também tenho um blog, o “Super Promonauta”. Se puder me faça uma visitinha também, e se por acaso gostar e quiser me seguir, será uma honra.
    Obrigado e parabéns pelo site!

    http://super-promonauta.blogspot.com.br

    ResponderExcluir

Você também pode gostar de:

Related Posts Plugin for WordPress, Blogger...